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O Passageiro Clandestino
Continua��o

� Foi o teu pai quem te fez isso? - inquiriu visivelmente comovido o mo�o de conv�s, que previa a resposta e n�o podia conceber como um pai fosse capaz de tais brutalidades a um filho.

Agostinho, na linguagem muda das crian�as, meneou a cabe�a a confirmar a verdade da pergunta do seu interlocutor, sem juntar qualquer coment�rio para criticar ou desculpar a desumanidade do seu progenitor .

� N�o tens mais outras pessoas de fam�lia?
� S� a minha av�, mas ela n�o vive na cidade.
� Com que foi que o teu pai te bateu?
� Com o cinto, explicou o pequeno mostrando o bra�o com um verg�o escuro.
� Isso tamb�m foi feito pelo cinto?
� Quando tentava prote-ger a cara, a fivela apanhou-me o pulso!
� Fizeste alguma coisa mal feita para ele te bater? - quis confirmar o mar�timo, que de antem�o sabia qual iria ser a resposta.

Confrontado por aquela pergunta que lhe viera reavivar a lembran�a de sua m�e e do que ela sofrera com o marido, o rapazinho deixou escapar um profundo solu�o que lhe abalou o corpo franzino.

�N�o senhor, n�o � preciso fazer qualquer coisa errada para ele me bater� Quando vem b�bado, n�o atina com nada e irrita-se por tudo. A minha m�e � que tentava muitas vezes defender-me e bastantes apanhou por minha causa � Agora que ela morreu eu n�o tenho quem me defenda!

Sentindo uma onda de compaix�o tomar-lhe o peito, aquele homem tisnado do Sol e do mar, com as m�os calejadas pelo trabalho duro dos afazeres de bordo, apertou a cara do mi�do com carinho, dizendo-lhe:

� Esta noite dormes aqui, n�o vou contar hoje ao comandante� Amanh� direi que te encontrei ao come�ar as minhas limpezas do por�o.

Como a pequena cabine tivesse duas camas, uma no topo da outra, o marujo que se chamava Armando e n�o compartilhava o camarote com mais ningu�m, depois de acomodar o pequeno na de baixo e amarrar-lhe um len�o � volta do pulso, apagou a luz, saindo para ir segurar os barris � solta no compartimento das cargas, depois do que trepou para a outra tarimba.

Com a sua mente simples pouco preparada para aquele g�nero de aventuras, Armando n�o conseguia conciliar o sono.

Revia a inf�ncia feliz com seus pais, gente pobre mas de bons princ�pios, que continuava a amar, apesar de os ver poucas vezes. Sentia que por via deles, pelo amor com que sempre o haviam tratado tinha de fazer alguma coisa por aquele rapazito.

Com a vida de saltim-banco que escolhera, nunca havia pensado em casar, o que n�o impedira que o instinto da natureza, que na maioria do g�nero humano deixa a sua marca intr�nseca, viesse despertar nele instintos paternais, a melhor defesa que Agostinho podia ter naquele momento, s� e longe da sua terra, l�.para os lados da Am�rica.

* * *

Entregue aos seus pensamentos, na tarimba de baixo, de mais f�cil acesso, Agostinho invocou a imagem de Clarice, uma amiguinha e colega da escola, naquele momento muito longe dele� Que iria pensar ela do seu desaparecimento quando, ao outro dia, n�o o visse na aula?

Andavam ambos no sexto ano dos prim�rios, aquilo a que, noutros tempos, correspondia � quarta classe.

Ambos eram inteligentes e entregavam-se a leituras depois das aulas na biblioteca do centro de ensino, onde falavam, trocavam opini�es, liam e sonhavam juntos planos de futuro, em que ela queria ser professora e ele engenheiro de ci�ncias el�ctricas.

Era quase como se os sonhos do jovem casal tivessem pela sua frente um porvir isento de dificuldades financeiras, as quais infelizmente aos desprovidos da sorte, acabam com tantas das suas aspira��es!

Como gostaria de lhe falar, de ouvir as suas palavras bondosas, de acompanh�-la na biblioteca e pedir-lhe talvez um conselho que o orientasse.

(continua)



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Toronto,
3/Mar�o/2003
Edi��o 770
ANO XXIII

   
   

   F. Feliciano de Melo

 

 

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